Dos meus tempos de universidade, há um momento que não me esquecerei. Estava eu parado a fumar o meu camel enquanto esperava o autocarro, quando reparo que no outro lado da rua, um velho dos seus 70 anos, carregado até mais não com sacos e tralhas e mais tralhas, que coitado, o homem lá ia arrastando aquilo à medida que se aproximava da gare para poder meter tudo na bagageira de algum autocarro, que presumo eu o levaria de volta à sua aldeia. Quando pôs o pé na estrada para atravessar, cambaleou, retorceu-se e caiu com todo o estrondo, junto com a parafernália de coisas que trazia em cima.
Estavam várias pessoas a passar junto, pensei, " alguém lhe vai deitar a mão". Nada, um, dois, três, quatro, passavam, olhavam com aquele ar de, "está com os copos", "está drogado", "não quero saber, está sujo", mas seguiam a sua vida. Depois de perceber que ninguém por perto fazia nada, lá fui eu a correr, quase a ser atropelado, mas lá fui ajudar o homem a levantar-se, perguntar se estava bem e ajuda-lo a carregar os tarecos e os sacos até ao autocarro.
Isto passou-se numa cidade pequena, em Trás-os-Montes, onde as pessoas se dizem tão afáveis e humanas, porque em Lisboa, ou no Porto já assisti a cenários igualmente escalofriantes.
Será que ninguém pensou sequer que o homem podia não estar bêbado? ou drogado? Estaria eu doido?
Agora entendo que aquilo eram os primeiros sinais do caminho que a maioria está a tomar. Agora percebo que cada vez mais, se confunde a insensibilidade e o egoísmo com força. Agora passa-se por uma situação dessas e diz-se "eu sou imune a essas coisas, é duro, é triste, mas consigo não ligar e seguir a minha vida". Agora um insensível é um tipo forte, porque aguenta a dor alheia e não reage. Agora sim.. vamos mesmo bem.
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