Tenho por hábito, depois de almoçar, tirar um café cheio, e junto com uma cigarrilha, desfrutar destes dois vícios em uníssono à varanda do meu apartamento. A paisagem não é grande coisa, um prédio enorme e horrível em frente, em baixo um polidesportivo, o resto é alcatrão e o cimento dos passeios.
Mesmo debaixo da varanda do meu 3.º andar, no outro lado da estrada, e parado no passeio, estava um velhinho com uma bengala extensível vermelha e um cãozito. Meteu a mão ao bolso, tirou de lá um pedaço de papel e atirou-o para a sarjeta. Como o papel ficou entre as frestas da grelha, com a bengala ia ajeitando-o de forma a que caísse, demorou nisto um minuto... dei comigo a pensar na velhice, e que ao contrário do que sinto agora, afinal se calhar mais tarde, as coisas fazem-se menos apressadamente e brincamos ou passamos o tempo com coisas deste género. O engraçado, é que depois do 1.º pedaço de lixo, o velhote meteu novamente a mão ao bolso, tirou outro pedaço de papel e repetiu o mesmo ritual, para depois tirar outro, outro, e outro.. contei quase 10! Uns caíam entre as barras da grelha, outros ficavam presos e lá ia ele com a bengala empurrando-os para o abismo.
Pensei melhor e afinal é assustador! Será que é melhor passar o tempo assim? ou em alternativa estar sentado num cadeirão de um lar a ver TV? ou até na cadeira de balanço num alpendre de uma quinta singela comprada com as poupanças de uma vida de trabalho?
Não! A mim não me apanham nessa, eu já tenho o meu projecto. Reformo-me e se tiver o mínimo de saúde ainda disponível para me mexer razoavelmente, vendo tudo, compro um veleiro, e passo os restos dos meus dias a navegar por esses mares, relativamente perto da costa, nada de viagens transatlânticas, e de marina em marina ou de porto em porto, lá irei atracando para descansar e visitar terra. Mas também admito que as coisas não corram bem assim, por enquanto, e até ver, sempre me parece mais interessante que andar a atirar pedaços de papel para um buraco.
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